segunda-feira, 6 de julho de 2009

uma leitura e a vida

apenas um relato com duas partes. nenhuma descoberta, nada incrível, apenas duas coisas de que me dei conta e sobre as quais quero falar.
parte um: a leitura...finalmente terminei de ler “a menina que roubava livros”, a parte de qualquer crítica literária sobre a obra (sobre isto podemos conversar outro dia, você me paga um café) outras coisas me ocorreram, outras coisas fizeram sentido para mim.
estou querendo falar sobre o ato de ler, não vou desenrolar uma teoria do conhecimento ou sequer uma filosofia da linguagem, eu não teria ferramenta para isto e nem é o que desejo, apenas fico pensando em como tudo isto é possível, como tudo acontece: que eu seja capaz de significar códigos impressos num papel, e que ao fazê-lo, imagens são projetadas na minha alma. isto é rico! nem consigo manifestar o quanto me sinto maravilhada.
quando leio, um filme se passa na minha mente, sensações são geradas, e são em certo grau vivas, são latentes.
quando leio me liberto do cotidiano, habito outro lugar, compartilho outras possibilidades, expando a mente. construo-me humano. haveria alguma metafísica nisto? o papel, imagens em mim, sensações, uma história, qualquer história, pensamentos, conexões, o mundo, no papel, em mim.
numa civilização de letrados a gente não se dá conta do que representa tal capacidade. que eu possa ler é impressionante! o que seja isto é espantoso e infinito...
a parte dois é a vida. é que iniciei a leitura deste livro no ano passado e, porque a vida exigiu de mim outras e tantas providências mais urgentes, abandonei a leitura antes de chegar a umas cinqüenta páginas. meses depois, exausta intelectualmente, exausta do trabalho e de todo resto daquilo que a vida me cercava, voltei a leitura como que para distrair-me do esgotamento. comecei lendo todas as noites uma meia dúzia de páginas e aos poucos a leitura foi novamente abandonada, submersa pela vida exigente e exaustiva, não cheguei nem a metade do livro. agora, de férias da faculdade, me dediquei a tarefa e pude experimentar a boa ansiedade para saber o fim da história.
de qualquer maneira foi a oportunidade de me distanciar dos meus dias profundos e cansados e de me conceder este prazer singelo. daí que fiquei pensando de quantas coisas na vida deixei de fazer, por preguiça, por apatia, e de como a rotina me absorve e me engana, não há nada de necessário no cotidiano, apenas hábitos incoerentes a que me conformei. penso também que devo despertar para outra coisa, algo que não sei exatamente o que é, e que não chega a ser só subjetividade, algo que intuitivamente já devo ter experimentado um dia, voltar ao caderno de escrita com mais freqüência, por exemplo, cultivar um senso de humor menos ácido e mais grato, cozinhar, fazer planos, lembrei-me de que em algum lugar da minha história eu gostava de desenhar, gostava de caixinhas de música, andava descalça e dançava enlouquecidamente, por horas, no meio da sala enquanto a faxina esperava, ela podia esperar, aquele meu ímpeto de extravasar, não!
pois bem, após um começo de ano difícil, ainda esgotada, um pouco mais lúcida, porém menos entusiasmada, considerando estas coisas e a doce alegria que sinto na alma apenas por terminar de ler um livro, embora não tendo vencido a terrível questão, embora não estando convencida de que haja sentido, finalmente e após dias, posso dizer e quero dizer porque hoje é concreto em mim, porque faz sentido mesmo que seja só por hoje: é bom estar viva! alguns dos que me lêem sabem bem do que estou falando. tal é o caso: necessito habitar meus dias, estou viva, e careço de estar atenta ao fato, há muito que fazer. estou viva e isto é bom!
k.guimarães

a fala sobre o corpo

“a fala sobre o corpo é uma fala-no-corpo sobre o corpo....corpo prévio a todo discurso,porque o discurso é obra – poiética – do corpo-falando”(almeida, 2001).

ousemos falar do corpo. talvez possamos nos arriscar a dizer sobre ele como se fora dele existíssemos ou sendo apenas uma fala provisoriamente sem corpo.o que é um corpo afinal? um homem? como ele nasce? o que ele é? seu prazer, medo, impulso, seu realizar, sua historicidade. o caso é que ele carrega muito mais do que somos capazes de abarcar, mas importa dialogá-lo, interpretá-lo e torná-lo de dentro-fora-dentro corpo vivo, corpo presente, corpo falante.e eu sou um corpo! o que sou, fui, foram, há, está impresso em mim e manifesto em corpo. minha forma, meu gesto, meu riso, meu saber das coisas, meu perceber do mundo, meu dizer no corpo, meu dizer do mundo no corpo que fala aos outros corpos.sem pensamento possível que alcance-o, existem palavras que o indicam, no mais: intuição... poiética! o corpo é, eis o conceito, assim, meu e seu corpo são. corpo imponderável. sem linguagem possível que o defina ou que o capture, exceto a linguagem silenciosa dos corpos sendo, existindo, e no vivido dizendo o que, como, quando e porquê são.

por guimarães em abril.