sexta-feira, 18 de junho de 2010

lucidez

Sinto que passei minha vida dentro de um trem que jamais parou. Da janela, solitário, vi muitos lugares ensolarados e cidades escondidas onde desejei saltar e me deter. Mas eu nunca pude: quando nasci, havia no meu berço uma serpente negra e a primeira coisa que vi coincidiu
com a derradeira.
Juliano Pessanha, "Certeza do Agora"

_exercício 3º adjetivação.

joguei a chave fora. joguei. não importa, nem quis saber e nem me recordar. basta!
papéis, botões, retratos, cadeiras, laços, poeira. poeira muita que embaraçou-se aos objetos e ao cenário, às relíquias que não verei mais, que não mais terei minhas.
se alguém a encontrar e a querendo abrir que abra, que vasculhe após a porta, que possua suas quinquilharias e que faça para si memórias.
apenas parto e rompo com alguns algos que não me deram lugar, tampouco alma.
joguei sem hesitar, como ainda agora não hesito, não olhei pra trás, não dei lugar a um passo atrás, e não sentirei privação por nada que deixei e que ficou.
joguei virei-me e segui. não há nada em meus bolsos.

_exercício 2º (!)

 "...acendi um cigarro e fiquei pensando...
- humildemente pensando na vida e nas mulheres que amei.
(manuel bandeira, poema para jaime ovalle)


recordando não de todas elas, mas especialmente das que deixaram em mim algo de que me lembro sempre às horas vagas.
de umas o cheiro dos cabelos, de outras a textura da pele. algumas prazerosas conversas, sorrisos, olhares e ânimos crentes de uma ordem no mundo.
assim como agora estou, aqui deitado, aqui sem pra quê, mas aqui – enquanto o tempo prossegue, assim também prossegue a vida e as conversas se foram, as horas prazerosas com elas.
esta chuva também há de se esgotar e depois, alguma hora dessas virá outra e após estas horas...outras. e as coisas da vida.
a manhã avança e acende-se o sol.
este quarto pede minha ausência, ensaio me levantar e acendo outro cigarro.