quarta-feira, 7 de julho de 2010

desadormecimento

dei para ter assombro da noite.
antes, o medo de assombração de outro mundo, não me deixava abrir olhos no escuro ou na noite da noite. agora o que me assombra é a noite pura e as vozes que ela acorda, porque são umas que não me deixam dormir, que me fazem ficar atenta, obrigando-me que as escute e fique a matutar nas coisas tantas. estas vozes falam todas umas após a outra, sem respiração, vezes há que falam ao mesmo tempo e insistentemente, enquanto eu faço uma prece como quem está diante da estrela que cai: "que eu durma! que eu durma! por deus que eu durma!", mas não, a fala destas vozes não deixam criatura alguma repousar. e se por uma poeira de instante consigo desviar o ouvido delas dou de cara com a noite escura e silenciosa, a mesma noite que fez dormir todas as coisas; me assombro mais demasiadamente! este silêncio... e por quê? não sei! é o silêncio oco que põe medo no vazio. posso admitir terrivelmente não saber o que é pior, as barulhentas vozes na noite da noite ou a noite pura me espreitando, a noite com seu silêncio e suas horas, o desadormecimento, a vigília, os espectros...
há uma coisa assombrosa que a noite faz acordar!

Um comentário:

Mário Coutinho disse...

Tem um quê de criança falando, aquela sufocada por nossa "adultice", que inclusive articula "adultamente", mas que é tão impotente diante dessas coisas assombrosas acordadas pela noite, como éramos assombrados pela possibilidade de subitamente sermos assaltados pelos monstros que habitavam debaixo de nossa cama.
Levei um tempo para conseguir dormir em cama, preferia o chão, dormia olhando para debaixo da cama, e assim garantia a certeza de não haver nada ali, pelo menos enquanto eu olhava.

Obrigado por me fazer lembrar disso.

Beijos!